quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Glaciar ao sol (79)

Fui-me derretendo. E derreti durante muito tempo. Por momentos pensei estar completamente só. Mas não estava. Nunca ninguém está completamente só. Por vezes gostamos de pensar que estamos, mas não é verdade. Alguns de facto estão sós, mas é por que o querem. E se o querem, então que estejam, pois talvez a sua vida dependa dessa mesma solidão. Mas eu, querendo ou não, não estava sozinho. Nunca estive, e ninguém nasce sozinho. Podemos morrer sozinhos, até porque a morte vem sozinha, mas nascemos com alguém. E eu deixei-me derreter, durante muitos dias. Não foi uma vida que ficou para trás. Foram momentos. E um futuro foi enterrado ainda mal tinha começado a crescer o presente. Mas a vida ensina-nos sempre algo, e quando não ensina, talvez seja a hora perfeita para a mudar. E eu derreti. Derreti durante dias. Dei comigo a viver por viver, deixando o meu eu, mais uma vez, a superar os obstáculos contrariado. E desta fase, nada de bom sobrou. Foram pequenos erros habituais que voltaram a nascer em mim...Acabo por destruir sempre algo belo. Destruímos sempre aquilo que mais amamos? A gargalhada é fria. Essas perguntas para mim são retóricas, cada um responda como bem entender. Somos a forma como amamos. Talvez aí encontre algum significado. Pelos menos gostava de encontrar.
Tudo o que consegui fazer, de forma útil para mim e para quem pude ajudar, foram dois meses de voluntariado, no centro de terceira idade. E toda a experiência que daí adveio foi excelente. E descobri um amor diferente. Um olhar sentido de agradecimento. Carinho. Ternura. Sempre odiei despedidas eternas, por isso acabarão por me esquecer, assim como eu me esquecerei de todos vós. Mas todos aprendemos e amamos de formas diferentes. Dei o meu melhor eu, por isso nada mais pude dar. E enquanto dei este eu por momentos deixei de derreter. A realidade é a mesma em todo o lado, por muito grande que um glaciar possa ser, por muito peso que possa pesar, pelo medo ou respeito que possa causar, o sol, esse sol que nos alimenta todos os dias, consegue ser ainda mais forte. Agora imagem toda essa força solar a tornar-se ainda mais forte com a ajuda do Homem. É imbatível. Existem males sem cura, mas com tratamento. Foi preciso estancar o sol, de forma possível.
Foi o momento certo para deixar de ligar a exemplos mitológicos. Deixar de me esconder na luz. A minha apologia, se dela alguém conseguir tirar algo de produtivo, será sempre escura...O monstro que existe neste meu ser nunca irá mudar, é o que sou, é o que faço, é o que escrevo. Não lamento ser este monstro, lamento sim ter tentado aprisiona-lo. Posso ser luz, posso querer espalhar luz, mas a verdade é que de certa forma, vivemos nas trevas.
Disse à minha irmã que temia algo de facto importante, e ela, mais consciente da realidade do que eu próprio, perguntou: Temes que o mal deste mundo vença o bem? A minha resposta foi rápida: Não, não temo. Porque o mal geral que recheia este mundo é pouco ofensivo, e o bem, apesar de pouco vai chegando para equilibrar. Terei então medo do quê?

Todos nós precisamos de algo que nos faça viver. Para alguns basta estarem vivos: respirar, comer e beber, fazer o seu dia-a-dia. Para outros basta: fazer o mal, fugir e criticar, matar ou roubar. Outros preferem: estar em contacto com a Natureza, desligados do Homem. A outros basta a sua Tribo, a sua família.
O que me basta?

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