segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Na varanda do Céu (74)

Não conseguirei imaginar lugar mais impressionante. E é engraçado pensar nestas coisas do ponto de vista de qualquer outro ser humano ou mesmo monstro. Pensar que esse lugar impressionante não impressionaria mais ninguém, ou muito poucos, porque muita da magia que aplicamos a um lugar depende só de nós, e a sua importância e beleza deriva de algo que está dentro do nosso ser, chamem-lhe coração, ou alma, ou mesmo razão. Por isso não posso transmitir, na totalidade do sentimento, aquilo que senti. Será tudo um esboço muito leve, quase imperceptível, de uma realidade difusa, de um sonho que se torna mentira, névoa, recordação. E mesmo que conseguisse transmitir este lugar, com toda a clareza, que sentiriam todos vós? Nada, ou com alguma sorte, alguma melancolia sorridente que nem sequer é vossa.
A vista poderia, a outros olhos, parecer tediosa, prédios de quatro ou cinco andares, não me recordo com clareza, e uma pequena rua por onde passam carros apenas de quem lá vive, com pequenos espaços para estacionamento; algum verde e um sol que se escapa por entre os prédios. E o sol sorria-me, talvez como nunca me sorriu antes, e aquecia-me os braços nus. Mesmo não sendo minhas, limpei as beatas do chão. Aquele chão era demasiado belo e puro para estar sujo com algo tão estúpido. E eu fumava, dois cigarros pela sede que faltava saciar. Mas a vontade não era ficar ali por muito mais tempo. Não. Mas o tempo que ali passei, em pé a fumar, a contemplar toda a calma do mundo, toda a harmonia do mundo, como se por momentos não existissem guerras, nem morte, nem doenças, nem pobreza...eu era o centro do mundo, eu era um ser em paz e em sintonia com a felicidade. Algumas pessoas dizem que o frio é psicológico. Algo que é contrário à exacta Ciência. Ao contrário do que possa parecer é com ela que concordo, no entanto, ali estava eu, de boxers e meias, e uma long-shirt fina e arregaçada, numa manhã de menos de oito graus, sem frio.
Naquela varanda, uma varanda única, onde o Céu regia todas as leias do Homem e do Divino, eu estava bem. Na varanda do Céu eu fumei sem a fome de um fumador, e respirei como só um homem livre na sua felicidade pode respirar.

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